A Neoenergia anunciou nesta quarta-feira (9/12) a
inauguração do Corredor Verde, a maior eletrovia do Brasil, que irá conectar as
capitais de Salvador (BA) a Natal (RN). Em live realizada pelo jornal Valor
Econômico, o CEO da companhia, Mario Ruiz-Tagle, defendeu o crescimento da
mobilidade elétrica no Brasil, como estratégia para a descarbonização. “É uma
tendência que vem para ficar”, afirmou. A transmissão ao vivo foi mediada por
Natália Tamura e contou com a participação do especialista em energia David
Zylbersztajn e do economista Eduardo Ávila. Confira os principais temas
abordados:
Valor: O que é o Corredor Verde de mobilidade elétrica,
inaugurado pela Neoenergia?
Mario Ruiz-Tagle: O Corredor Verde é uma iniciativa para facilitar a
mobilidade elétrica, criar cultura para poder facilitar e trazer para o
Nordeste um elemento muito importante, que é o veículo elétrico. É um meio de
mobilidade que as pessoas hoje estão procurando contribuir de maneira
individual a esta transição energética. É o maior corredor elétrico do Brasil,
vai unir a capital da Bahia, Salvador, a Natal, uma distância de 1.100
quilômetros pela costa do Nordeste. Vamos atuar em seis dos nove estados do
Nordeste, a princípio. Estamos trabalhando com 18 eletropostos, denominados super
chargers, que são aqueles que permitem carregar dois veículos ao mesmo
tempo em 30 minutos. É uma parada um pouco mais extensa que uma parada normal
que a pessoa faz para descanso em uma estrada. O nosso objetivo é testar a
nossa própria frota. Desde março de 2020, o grupo começou a trabalhar
fundamentalmente com veículos elétricos e caminhões elétricos para fazer o
atendimento aos nossos clientes. Faremos o teste durante o ano de 2021 e a
partir do ano de 2022 já oferecer para a população os eletropostos e conseguir
criar um modelo de geração econômica para fomentar a mobilidade elétrica com
veículos elétricos.
Valor: Qual é o objetivo da Neoenergia ao investir em
mobilidade elétrica?
Mario Ruiz-Tagle:
O Corredor Verde é uma medida que tem por objetivo facilitar a mobilidade
elétrica. O que procuramos com isso? Contribuir, dentro do que o setor elétrico
considera que tem um grande fator, produto da sua própria estrutura de rede,
para que os veículos de combustão, hoje a óleo, migrem para emissões de zero
carbono. O primeiro passo foi o programa de álcool do Brasil, o grande programa
de biocombustíveis. Não esqueçam que, antes de falar na emissão zero, nós
passamos pelos biocombustíveis. Tivemos uma discussão muito curta no tempo,
pela velocidade dos avanços tecnológicos, porque surgiram outros que se
mostraram mais eficientes e capturaram esse nicho que os biocombustíveis
tiveram. Isso é hoje fundamentalmente a geração eólica e a geração solar. No
começo, em 2004, se falava no Brasil de um grande programa de biocombustíveis
para a queima de álcool em usinas no interior do país. Esse programa
evidentemente foi ultrapassado pelo avanço tecnológico da eólica. A eólica, 20
anos atrás, era um sonho e hoje em dia tem um volume de energia que já é
suficiente em alguns momentos para abastecer todo o Nordeste, região que era
naturalmente importadora de energia se converteu em exportadora de energia.
Além disso, temos a geração distribuída, que é uma grande contribuição para a
democratização da energia elétrica. Isso permite as microrredes e a entrega da
energia a pessoas que estão hoje em dia carentes desse serviço. Nós temos
desenvolvido na Neoenergia o maior programa de Luz para Todos no Brasil,
ligando pessoas durante os últimos anos. Temos usado esse tipo de tecnologia e
tem se mostrado de sucesso.
Valor: Como a mobilidade elétrica pode crescer no Brasil?
Mario Ruiz-Tagle:
Todos temos que apostar, as indústrias, os empresários, os empreendedores e a
população, além do governo, com a política tributária e a regulação. É uma
tendência que vem para ficar. O Brasil tem uma mente renovável, uma cabeça
verde, uma bandeira verde e amarela e isso a gente tem que usar no mundo. É um
patrimônio que o Brasil tem.
Valor: Como o senhor vê o conceito dos 3 “Ds” da energia:
descarbonização, descentralização e digitalização?
Mario Ruiz-Tagle: Nós
já trabalhamos muito o desenvolvimento desse conceito de 3Ds. Mas também
queremos colocar duas questões que hoje são fundamentais. Uma delas é o
conceito de eficiência energética. A energia limpa é a mais limpa que a gente
consiga gerar, mas a mais limpa é a que a gente não utilize e a que a gente não
faça uma intervenção no meio ambiente. A população e as indústrias precisam
tomar consciência da importância da eficiência energética, da importância do
fim desperdício de energia. É muito importante para diminuir o custo que vai
representar a energia, uma porcentagem importantíssima da energia que cada
consumidor paga hoje é a que perde, aquela que fica nos equipamentos ligados à
noite, nas geladeiras ineficientes. Nós temos avançado muito sobre o conceito
da letra “E”. E agora a letra “F” (de financiamento). Já não tem investidores
dispostos a destinar recursos para construir infraestrutura que gere impactos
no meio ambiente.
Cada dia tem mais consumidores preocupados com a fonte do
produto que ele está comprando. Hoje, por exemplo, grandes fornecedores fazem
consultas muito sutis, mas importantes: o produto que eu estou vendendo para
você vai ser implementado em uma zona que tenha sido desmatada, é uma reserva
da biosfera, tem uma particularidade de preservação do meio ambiente? Ninguém
quer e nós menos. Nós, promotores da construção dos empreendimentos
energéticos, não queremos ser os autores ou a cara visível de um fenômeno que
vá contra a nossa própria filosofia. As fontes de financiamento hoje são cada
dia mais restritas do ponto de vista do cumprimento ambiental. As empresas têm
que procurar a sua atuação dentro desse novo modelo de funcionamento energético
da humanidade para conseguir diminuir as mudanças climáticas e conseguir que o
mundo entre já com compromissos objetivos de redução de emissões. Dentro desse
contexto, de compromisso de redução de emissões, a Iberdrola tem o compromisso
de reduzir a 0% a emissão de CO2 por kWh em 2050. Nós temos que começar a
trabalhar com antecipação, isso é mudança cultural, regulatória, no
comportamento das pessoas, que vão conseguir unir todas essas iniciativas, para
que realmente essa transição energética seja positiva.
Valor: Qual a
fonte de energia que abastece os postos do Corredor Verde, vem da rede, vem da
energia renovável? Quando o Corredor Verde será disponibilizado comercialmente
para o público utilizá-lo?
Mário Ruiz-Tagle:
Esse é um fator importante, não adianta ter um Corredor Verde se a energia que
a gente gera não é limpa. A energia do Corredor vem da rede, do Sistema
Interligado Nacional, energia que circula pelas nossas áreas de concessão e
distribuição. O trabalho não é apenas incorporar na rede um volume cada vez
maior de energia proveniente de fontes renováveis. Nessa linha, temos
desenvolvido nos últimos anos os projetos eólicos Oitis e Chafariz, que são da
ordem de 1 mil Megawatt de potência instalada localizados nos estados do
Nordeste, entre Bahia e Paraíba para incorporar energia que permita abastecer
estes postos. A vantagem é que a matriz energética brasileira vem de fontes
hidrelétrica, eólica, fotovoltaica e fontes renováveis. Isso nos garante que os
eletropostos estão abastecidos, pelo menos, com boa porcentagem dessa matriz,
sobretudo considerando que grande parte da geração nos estados do Nordeste,
hoje, é energia renovável.
Quanto a fazer o aproveitamento comercial, eu diria mais
que comercial e sim abertura ao público para que ele possa usufruir desses
eletropostos. Nosso objetivo é fazer testes durante o ano de 2021. São vários
tipos de testes, com carros 100% elétricos, carro híbrido, carro a combustão,
para mostrar para a população qual é a vantagem de migrar para o carro elétrico
ou pelo menos conseguir acelerar o carro híbrido, que são aqueles que funcionam
por energia e também podem funcionar por combustível. A nossa intenção é que, a
partir de 2022, o sistema do Corredor Verde fique aberto para que toda a
população que transita pelas estradas do Nordeste possa utilizar. Este é um
projeto que está sendo desenvolvido por meio de um programa de Pesquisa e
Desenvolvimento, fiscalizado e patrocinado pela Aneel e o objetivo é demonstrar
que a solução de mobilidade elétrica nas vias do Nordeste é viável,
economicamente rentável e acessível para a população.
Um ponto importante, sobretudo no quesito comportamento
que visamos fazer com toda a operação desta rede, é influenciar o comportamento
da população para que consigam ter um carro elétrico e dividir ele. Isso, sem
dúvida nenhuma, servirá para o regulador aprimorar a regulação futura que
permitirá a expansão desta rede. Nosso projeto não acaba neste Corredor, esta é
a principal estrada que percorre a região Nordeste, mas o nosso objetivo é
fazer também corredores dentro das nossas áreas de concessão, utilizando as
principais estradas estaduais.
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